Decisão da STF pelo não pagamento do IPI em caso de furto da mercadoria.
A
2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a Receita
Federal não pode cobrar IPI sobre mercadorias roubadas que seriam
destinadas ao mercado externo. A discussão entre os ministros foi
acirrada, mas prevaleceu o entendimento que não houve fato gerador
porque a mercadoria não foi entregue ao comprador. Há dois anos, no
entanto, em um caso semelhante, a turma havia julgado em sentido
contrário. Naquele caso, porém, os produtos ficariam no mercado interno.
Para o relator do caso, ministro Herman Benjamin, a segurança é um
dever do Estado e, por isso, a empresa não deve recolher o imposto em
caso de roubo ou furto. O ministro chegou a mudar seu Voto durante o
julgamento, iniciado em abril e concluído na quinta-feira. Com esse
entendimento, a Souza Cruz Trading conseguiu cancelar uma autuação
fiscal lavrada em 2000, no valor de R$ 115 mil. A empresa teve a carga
roubada no caminho entre Uberlândia (MG) e o Porto de Santos (SP).
Em sua defesa, a empresa apresentou números para demonstrar o alto
índice de roubos e furtos de cigarros e custos com a segurança no
transporte das cargas. Em 2010 e 2011, foram gastos R$ 54 milhões em
Serviços de escolta, de acordo com a advogada da empresa, Janaína
Carvalho Kalume, do Eduardo Antônio Lucho Ferrão Advogados Associados.
Só em 2010, foram contabilizados 1.606 roubos e furtos de cigarros da
Souza Cruz. "Por causa disso, a empresa foi autuada diversas vezes", diz
a advogada Cristiane Romano, do Machado Meyer Advogados, escritório que
atua em conjunto na defesa da Souza Cruz. A 1ª Turma do STJ também
deverá analisar a questão neste ano a partir de um outro processo da
empresa.
Em nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou
que deve recorrer da decisão. O órgão vai citar, em sua defesa, uma
decisão de 2010 da mesma turma em sentido contrário. Os ministros
negaram o cancelamento de um auto de infração da Phillip Morris. Na
ocasião, a maioria seguiu o entendimento do relator, ministro Mauro
Campbell. Ele entendeu que o fato gerador do IPI ocorre com a saída da
mercadoria do estabelecimento do vendedor. "Não se pode adotar linha
interpretativa que transforme o ente público tributante em segurador
universal da Atividade Econômica desenvolvida por todos os sujeitos
passivos", afirmou o ministro na época. Segundo a PGFN, "o entendimento,
inclusive, corrobora a defesa da Fazenda Nacional para o caso [da Souza
Cruz]".
No caso da Phillip Morris, porém, a mercadoria seria vendida no
mercado interno, o que, para advogados, justificaria a diferença no
resultado dos julgamentos. Isso porque a exportação daria direito à
imunidade tributária ao contribuinte. A autuação teria ocorrido porque a
empresa não comprovou a operação que lhe daria direito ao benefício.
Nas vendas internas, entretanto, o tributo teria deixado de ser pago.
Para o tributarista Daniel Correa Szelbracikowski, da Advocacia
Dias de Souza, será necessário esperar a publicação do acórdão para
saber se há precedente favorável para os casos referentes ao roubo de
mercadorias vendidas internamente. "O raciocínio poderá ser aplicado
para casos de furto ou roubo de qualquer bem, destinado à exportação ou
não", diz o advogado. Como mudou seu voto, o ministro Benjamin ainda
terá que redigir o acórdão.
Para alguns advogados, o entendimento adotado pode ser aplicado
indistintamente. "A exportação em si é mais um dado, não é determinante
para a questão", afirma Cristiane Romano, acrescentando que dois
ministros seguiram o mesmo raciocínio nos dois julgamentos. Na época, o
ministro Castro Meira chegou a classificar a situação de kafkaniana pelo
imposto ser exigido sobre uma operação não concluída. "Nada mais
assustador", disse. O ministro Humberto Martins, por exemplo, mudou seu
entendimento sobre a questão de 2010 para cá, votando agora pela não
incidência do imposto.
Alguns advogados, porém, defendem a cobrança. Para José Eduardo
Toledo, sócio do Gaudêncio, McNaughton e Toledo Advogados, não há lógica
em admitir a isenção de mercadorias roubadas uma vez que o fato gerador
do IPI, de acordo com o regulamento do imposto (Decreto nº 2.637, de
1998), é a saída da mercadoria do estabelecimento. Na opinião de Rodrigo
Barreto de Faria Pinho, do Guerra, Doin e Craveiro Advogados,
entretanto, é justamente o fato gerador do imposto que foi atacado no
julgamento. "A interpretação foi flexibilizada para admitir a incidência
na saída do produto em decorrência de um negócio jurídico. No caso, não
existe negócio porque houve um roubo", diz.
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